12 de dezembro de 2007



Eu tenho este chefe. Dantes não era meu chefe, era só doutros e a coisa passava, mais ou menos. Quer dizer, era chato ter um colega que se babava para cima de mim, que não se dava sequer ao trabalho de disfarçar pretextos para fumar uma cigarrada ao pé de mim, que se pendurava para almoçar comigo e com os meus eleitos, mandava e-mails atrevidos e às vezes mais do que isso, isto era chato, sim.
Era chato ter os colegas a picarem-me por causa da tusa desmedida do gajo por mim, era chato tê-lo nas festas de natal a dar em cima de mim, salvo seja!, quando eu queria era comer, beber e rir com os colegas mais próximos.
Era chato, mas a coisa aguentava-se e durante anos aprendi a conviver com as suas tentativas de avanço, aprendi a relativizá-las e às tantas já quase não dava por nada.
Mas depois de chato, passou a ser grave, mais grave, quando a reorganização cá de casa me levou a trabalhar directamente com ele. Reuniões a dois, serões a dois, saídas para o exterior a dois, tempo demais a dois, coisas demais a dois.
Ele passou a ser mais cuidadoso, se bem que não menos insistente. Não é burro, é até um gajo inteligente, apesar de estas atitudes não o demonstrarem, mas sabe o que não pode fazer e agora os avanços são velados. Tão velados que se falar a alguém que não lhe conheça o historial, serei eu a passar por alucinada, convencida até, com a mania que sou boa, que o gajo até é só porreiro e acessível. Tão velados que agora que era preciso já não há provas materiais da coisa. Inteligente nisto, burro-burro-burro por ao fim de tantos anos ainda se dar ao trabalho comigo.
Quer dizer, um piropo de vez em quando faz bem ao ego, não falo dos piropos de andaime, mas desses que nos fazem sentir interessantes, sim, pode ser simpático. Mas a coisa muda de figura quando isto se passa numa relação laboral, ainda por cima em níveis hierárquicos problemáticos.
Este texto não é erótico, é antes altamente pornográfico, ou melhor, assenta num facto pornográfico, que é o assédio sexual no local de trabalho, e eu estou zangada porque não estou a conseguir dar a volta à cena.

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